sexta-feira, 10 de abril de 2009

POR FAVOR, NÃO SOU LOUCO!

Quem nunca sentiu a extrema necessidade de sair “caminhando contra o vento, sem lenço, sem documento, no sol de quase dezembro?” Existe sempre uma vontade, às vezes espontânea, de sentir-se livre. A liberdade, em alguns momentos – principalmente quando se é jovem demais –, é vista sob a ótica daqueles desapegados de compromissos com outras pessoas. Todavia, com o passar do tempo, percebemos que a liberdade é muito mais um estado de espírito que a ausência de uma outra pessoa. O ser humano, por natureza, necessita de carinho, amizade, amor e segurança. E estar livre é gozar das características humanas em sua, ao menos, quase totalidade. Pouco tem haver o fato de estar com compromissos, ou não. Na verdade, o que vale é estar bem consigo mesmo. Mário Quintana já dizia que para atrair as borboletas era necessário somente cuidar do seu próprio jardim. Quando se está bem espiritualmente se está pronto para os sentimentos mais humanos. A capacidade de estar disponível para o amor quando se está realmente disponível é extraordinária. Os que não conseguem sentir no coração sentimentos que não sejam raiva, mágoa, fobia de sentir, desespero, angústia, desesperança etc, são pessoas incompletas. Precisamos aproveitar as melhores coisas da nossa juventude. Juventude esta que nem sempre irradia em quem tem pouca idade. Precisamos ver o companheiro como uma pessoa que, realmente, possa amar de verdade (ainda que no futuro longínquo) e que possa ser fiel. Fidelidade não da carne, mas da confiança e amizade depositada nos sentimentos inesgotáveis. Sentir a amizade apertar o coração, a confiança evidenciar formas e o medo de dizer coisas bonitas por não querer estragar tudo, é comovente. E você, leitor, pode até achar que sou um louco, mas tudo que eu sempre quis foi “Depois de tudo ainda ser feliz. Mas já não há caminhos pra voltar. O que é que a vida fez na nossa vida? O que é que a gente não faz por amor?”

CRESCER DÓI!


Sabe, cresci imaginando que o mundo acabaria no ano 2000. Coisas de adolescente medroso. Na verdade, todo adolescente tem muito medo. E esse medo sempre guardei a sete chaves na caixa da minha prepotência. Coisas da idade. Mas acontece que, em 1997, na Cidade de São Gonçalo, no Estado Rio de Janeiro, ouvíamos Mc Marcinho e Cacau, ainda que escondido no canto da sala para os amigos não saberem, pois o Funk sempre foi muito mal visto. Eram músicas consideradas de baixo escalão, mas sempre gostei. Falam de amor, sofrimento, desilusões, sonhos e esperanças. Imaginávamos que o destino de todo homem era encontrar a mulher ideal e ser feliz. Sabe aquela estória de querer definir a vida quando se tem apenas 16 anos? Era mais ou menos isso! Mas esse desespero não vinha simplesmente do medo do fim do mundo. Vinha de uma vontade imensa de se viver tudo que Marcinho e Cacau, Claudinho e Buchecha e Suel e Amaro, cantavam. O que fazer para aproveitar a vida em 3 anos?

PRIMEIRA

Lembro-me muito bem quando e como conheci minha primeira namorada. Era uma linda menina ruiva, tinha 14 anos, católica e muito bem educada. Parecia uma princesinha romena. Na ocasião, os amigos da rua 18 estavam organizando a festa de fim de ano de 1996 e a menina ruiva foi convidada por uma amiga da rua. Seu nome: Heloísa. Ah! Ela tinha cabelos bem vermelhos, pintinhas no rosto, um sorriso perfeito. Era tímida, recatada. Pensei que não me daria confiança, mas deu. Trocamos olhares desconfiados sem palavra alguma até meia-noite. Assim que virou a ano, aproximei-me de Heloísa e sem que minha razão conhecesse meus atos, disse:
Você está linda! – disse olhando para seus dois cachinhos caídos em seu rosto.
Você está brincando, né? – perguntou-me como se eu fosse um cafajeste investindo mais uma cantada.

COMO AMIGO?

Ficamos conversando no banquinho de concreto que meu pai fez na última reforma, há uns três anos. Não tinha muitas experiência para saber ou não se uma menina estaria me dando bola ou não, mas, tinha em meu coração, a intuição de que algo verdadeiro nascia naquela jovem que imaginava ser de outro cara. Existia algo no olhar de Heloísa que me dizia o quanto ela me queria, o quanto me desejava. Precisava saber exatamente saber o que fazer para arrancar de uma menina tão pura, seus sentimentos mais íntimos. Eu não sabia o que fazer. Essa era a realidade. Se tentasse algo, poderia escutar: “Você confundiu as coisas ou só te quero como amigo.” Porém, não tentar uma aproximação naquele momento, representaria a derrota sem ao menos uma ofensiva. Precisava dar o pontapé inicial.

...

Eu, emocionado, contudo, um pouco distante das palavras das crianças, analisava as múltiplas faces de Heloísa. Cada suspiro parecia dizer o muito que ela sentia e o pouco que podia ser feito. Aos poucos, outras crianças foram chegando e se misturando, de maneira que ficou difícil concentrar-se em uma só.


Tentei concentrar-me em um peixe só no lago. Seria um teste para saber o quanto poderia desligar-me deste mundo. Por instantes desejei ser aquele peixe vermelho que parecia mandar no pedaço. Eram fortes os desejos de não mais respirar pelos pulmões, entretanto, a esperança de ver aqueles pequenos, um dia, adultos e felizes, inclinava-me a uma renovação como pessoa. Não mais importava o amor de Heloísa. Minha vida era tão pequena. Foi quando perdi o peixe vermelho de vista ao ouvir:
Precisamos ir embora. A galera já está no portão!
É. Vamos lá!

NA HORA É QUE SÃO ELAS...

Crescíamos como se nada em volta mudasse com o tempo. A minha turma, além de os Nerd’s, era popularmente conhecida como os roqueiros. Apesar de nem todos serem roqueiros. Queríamos aproveitar a vida em uma favela que não nos dava muitas condições de atingir um grau considerável de diversão, contudo, exercíamos a feliz atitude de ser. E essas felicidades esporádicas, somente saberíamos ser prazerosas anos depois. Na hora tudo é muito confuso e vergonhoso. É o medo de servir de chacota para com os amigos, de tomar um não de uma menina, de tomar uma bronca do pai no meio da rua, enfim, tudo aquilo que parece ser o fim do mundo, mas que com o tempo torna-se uma grande comédia.

O QUE SERÁ?

Lembro-me bem de cada rosto, cada sonho. Sonhávamos ser famosos e ter muito dinheiro. Queríamos muitas mulheres e carros, mas detrás de sonhos exuberantes, acredito, existir um único desejo: ser feliz. Não queríamos ser como nossos pais ainda eram. Talvez nossos pais fossem felizes, mas deveríamos ser tudo aquilo que eles sonharam e não conseguiram ser, por motivos diversos.

SONHAR NÃO CUSTA NADA

Não tínhamos, nessa época, nem sequer um plano de como ser vitorioso, mas conseguíamos visualizar nossa realização, e assim como muitos garotos, sonhávamos distantes do que realmente viríamos ser.
Viver é bom! As garotas da turma também sonhavam ser estrelas da televisão, modelos ou cantoras. Queriam sucesso! Não sabíamos, mas o maior tesouro que tínhamos eram nossos sonhos. E hoje, um dos maiores tesouros que temos é relembrar o que sonhamos e comparar com o que realmente nos tornamos.

AMIGOS

Não consigo recordar todos os amigos que tive ao longo de minha adolescência. Alguns amigos chegaram e conosco permanecem por muito tempo deixando marcas impossíveis de serem apagadas. Outros passaram em curta temporada sem, ao menos, deixar vestígios em nossa memória depois de dois anos. Existem aqueles que ficam muito tempo ao nosso lado, mas por serem tão discretos podemos contar em uma única mão o número de estórias inesquecíveis. Em contrapartida, existem os amigos que passam em nossas vidas como foguetes, porém, deixam seqüelas irreparáveis.


Na galera da minha rua existiram todos os tipos amigos mencionados. Ainda que caminhássemos rumo à vida adulta e quiséssemos parecer homens de verdade frente às mulheres, corríamos como crianças loucas pelas ruas do bairro a procura de diversão, subíamos em árvores, tocávamos as campanhas alheias e fugíamos em seguida, enfim, era contraditório nosso momento. Neste sentido, todas as brincadeiras, ainda que causasse danos às outras pessoas, eram viáveis.

VIRGENS E MENTIROSOS

Quando se tratava de sexo todos nós já tínhamos ficado com várias garotas. Nenhum de nós era virgem. Contávamos vantagem até mesmo sobre a duração de uma relação sexual. Mas na verdade, nada sabíamos sobre sexo. Éramos todos virgens e mentirosos. Acredito que foi melhor assim, pois ninguém deveria saber exatamente o quanto o colega é inexperiente. Quem era o cabaço da turma, geralmente, era zoado de montão e isso não era nada legal para auto-estima. No fundo, todos nós nos divertíamos, menos o chacoteado.

SEMPRE ELA


Em frente à minha casa, sentados em um tronco de árvore, contávamos conquistas e derrotas. Muitas vezes planejávamos convencer alguma menina a ficar com alguém da galera. Isso tudo acontecia depois das 18:00 horas, quando a noite começava aparecer. Quando as meninas juntavam-se à galera, a festa estava completa. Além da necessidade de aparecer cada vez mais, disputávamos que conseguiria ficar abraçado com a mais bonita delas. Quase sempre não conseguia sucesso, mas acreditava que quando acontecesse não seria somente por distração, mas por algo forte e duradouro. Ao perceber a maioria dos colegas abraçados com alguma menina, sem perceber, vivia uma comédia romântica em minha cabeça. Era como estar o corpo presente e os pensamentos em outros lugares. E quando pensava em garotas, pensava em Heloísa. Foi quando, um dia, a mesma apareceu na minha frente acenando com a mão em meu rosto para demostrar que realmente eu estava longe. Levei um baita susto. Como essa menina consegue aparecer e desaparecer aos meus olhos e pensamentos com tanta rapidez?

SONHOS DE UMA NOITE DE VERÃO

Naquela noite a encontrei na esquina da minha rua. Eram 19:00h em ponto quando sua Caloi parou ao meu lado. Eu estava a pé. Fiz isso de propósito, pois queria levá-la sentada no banco de trás de sua Ceci. E a sua bicicleta era boa. Corria bastante. Cada pedalada valia por duas da minha pobre bicicleta. Num instante estávamos do outro lado do bairro. Estava um clima muito quente e o vento que batia em nossos rostos, em função da velocidade que estávamos, nos refrescava. Era uma linda noite de verão. Ah! Eu lembro como se fosse hoje. Calor, estrelas, lua e muita gente na rua. Parecia que todos olhavam o casal mais bonito que passeava de bicicleta naquela noite.

Após vinte minutos de vento, risadas e desvios dos inúmeros buracos da rua, paramos em uma pracinha. Nesta praça, vários casais apaixonados olhavam-se, talvez, por horas. E conversavam olhando de perto mesmo, olhando nos olhos. Acho que deveria fazer o mesmo e saber, enfim, a sensação incrível de desfrutar de momentos a dois! Cada casal, apesar do amor que exalava no ar, apresentava maneiras diferentes de aproveitar o momento. A maioria estava ali aos beijos e paravam somente por poucos minutos. Existiam aqueles que pareciam estar em conflitos de propósito para depois aproveitar de um beijo mais gostoso. Outros só conversavam mesmo, bem de perto e se acariciando. E eu ao lado da mais bela, observava.

APOTEOSE DO MEU CORAÇÃO


Fui interrompido por um forte abraço. Um abraço de verdade. Sua cabeça batia na altura do meu peito e foi ali que seu rosto colou por alguns pouquíssimos dias. Ela não disse nada. Apenas suspirava. Ela não parecia não desejar outra coisa no mundo, somente abraçar-me. Estávamos tão próximos que conseguia sentir os batimentos de seu coração, ainda verde, na altura do meu estômago. Coração este que era meu, por sinal.
Depois de algum tempo, ela me olhou e disse que precisava sentir meu calor. Pediu também que eu a abraçasse mais forte e não a soltasse jamais. Fiz e gostei. O seu peito era tão quente! Tive a certeza que o seu colo fora feito na moldura exata do meu peitoral quando Helô subiu em um paralelepípedo quebrado. Era o encaixe perfeito. Naquele momento fomos somente um, éramos grandes companheiros. Pude imaginar até mesmo nossa velhice. Aquela “menina idosa” me abraçando com a pouca força que ainda restara em seu corpo. Seríamos felizes na alegria e na dor. Por tempo que nunca consegui determinar ficamos sozinhos naquela praça. Nada mais existia; ninguém mais existia. Até mesmo os transeuntes mudaram o rumo preferindo outras ruas, outros acessos. É importante notar que somente eu e Helô existíamos e isso bastava.

ENFIM

Quando fui dormir fiquei pensando em tudo que havia acontecido no dia. Passou em minha mente cada detalhe. Imaginei como teria sido se, naquela terça-feira, não estivesse em casa quando Heloísa chegou. Na certa, não seria o cara mais feliz do mundo naquele momento. Eu não conseguia dormir. Pensava sem parar. Na minha mente um turbilhão de possibilidades atordoava-me. Na verdade, pensava como um louco. Parecia que um longa-metragem passava em meu cérebro, contudo, algumas cenas, insistentemente, repetiam-se por várias vezes. Aquele abraço! Nunca ninguém me abraçou daquele jeito, como se eu fosse a pessoas mais energética do planeta deixando fluir as minhas forças de maneira eterna, inesgotável. Estava, enfim, realizado.

HELOÍSA

Heloísa era uma menina na qual sua imagem nunca seria perfeitamente interpretada. A cada momento, uma face. A cada sentimento, uma coloração. O seu rosto, e as diversas transformações que expressava, dava nomes, ainda que numa linguagem sem palavras, aos sentimentos que ainda não foram descobertos ou inventados. Era a garota que expressava descobertas futurísticas pelo simples ato de sussurrar. Entretanto, aqueles que a amavam podiam ler e sentir, enquanto prestavam atenção, o quanto a energia de sentimentos positivos exalavam da sua existência. Existia algo anormal em sua pessoa. Algo que nenhuma menina possuía. Algo santo, sacro. Por mais que eu tentasse deter-me em seu olhar, em sua pele repleta de sardas, jamais conseguiria fotografar com exatidão a beleza da sua pessoa. Heloísa era desprovida da fragilidade de ser capturada pela superficialidade das imagens. Aquela menina estava muito acima disso.


E eu, absorto em meus pensamentos, ora puro ora leviano, a contemplava, talvez, por segundos ou minutos; ainda não sei ao certo. Ela sempre perguntava o que estava pensando, e eu, sem saber explicar muito bem, apenas dizia: - Em você, Helô!

COMBINAÇÃO PERFEITA

Nos encontramos naquela noite no valão, perto da quadra de futebol da favela. Cada um em sua bicicleta, decidimos dar uma voltas e conversar sobre o pedido de namoro que faria aos seus pais. Helô me explicava sobre minha postura e o que deveria falar. Depois de quarenta minutos de passeio, voltamos ao mesmo lugar. Encostamos as bicicletas na beirada do valão, e sentamos um ao lado do outro na calçada da rua, como se tivéssemos num cenário de uma novela de época. Apesar da minha imaginação nos levar a tempos por nós não vividos, Heloísa usava uma bermuda jeans clara, chinelos de dedo e uma blusinha branca de renda. Não lembro ao certo como vestia-me. Lembro-me bem em como o jeans, em tom claro, ficava legal naquele corpo pequeno e suave. Tudo em Heloísa combinava. Era a exata combinação do carinho e a rosa.

SEMPRE


O BEIJO

Era nosso primeiro beijo. Não poderia dar errado. Nossos dentes não poderiam bater um no outro, não poderíamos beijar o nariz por engano e nem babar muito. Esperava uma dica do céu mostrando-me a hora certa de avançar o primeiro passo. A resposta não veio, porém, quando nosso assunto esgotou, o silêncio que invadiu nossas almas permitiu que olhássemos dentro um do outro, talvez invadindo a alma com força que ninguém imagina.. A distância que estávamos era parecida com a largura da barra de chocolate que tinha dado à Heloísa e que, naquele momento, já não existia, restando somente a embalagem e o gosto doce em nossas bocas. Pude sentir o perfume do seu batom com chocolate. Que cheiro bom. Seu batom era rosa brilhante bem claro, combinando com a cor de sua pele. Lembro que primeiro nossos narizes encostaram-se. O cheiro da respiração de Helô parece ser diferente do meu. Houve um pequeno recuo, mas nessas horas não se pode voltar atrás. Nos beijávamos em pensamento, flutuando na perfeição de nossos espaços simétricos. Quando nossos lábios se encontraram, tentei encaixar de maneira perfeita minha boca em sua boquinha linda. Foi o melhor beijo que experimentara. Era uma leve mistura de batom, chocolate e da poção Heloísa – poção essa que, agora, era só minha e de mais ninguém. Nos beijamos por uma eternidade. Em nada se comparava o beijo de Heloísa com a maçã, o copo com gelo e o meu braço, que eu costumava treinar escondido em casa. Era fantástico sentir o calor e a textura da sua língua, o leve tremular de seus lábios.

EU "ERA" DELA

Assim que terminamos nosso primeiro beijo, Heloísa apertou ainda mais nosso abraço, e, chorando, pediu que não a deixasse jamais. Não entendi muito bem. Eu era somente dela, inteiramente dela. O que estava acontecendo? Fez-me prometer amá-la até o último momento. Até mesmo quando não pudesse mais amá-la. Eu prometi. Estava apaixonado.

NADA MAIS EXISTIA

Ela fez o mesmo! Com um olhar, penetrante e avassalador, fez-me desprender ainda mais deste mundo material e partir, por tempo desconhecido, a um lugar onde os únicos seres viventes eram eu e ela. Todo o barulho dos ônibus que passavam na rua principal, os cochichos dos transeuntes e o canto dos grilos vindo do mangue, foram extintos temporariamente de nossas audições. O som que imperava soberano naquele novo e maravilhoso lugar era o suspirar de nossos corpos.

A CAMINHADA


Na noite seguinte - uma linda noite de Domingo - Heloísa me procurou. Disse que queria caminhar comigo. Já havia tomado banho e só entrei em casa para trocar os chinelos, pois estava com os da minha mãe. Andávamos de mãos dadas sem dizer uma palavra. Nossa presença bastava. Heloísa tinha o Rodrigo e vice-versa.



Não agüentei e desatei em lágrimas em frente da mulher da minha vida. A partir do momento que comecei a chorar, não conseguia dizer mais nada. Não sabia onde enfiar minha cara, mãos e pensamento. E por essa carência e insegurança que nos abraçamos e choramos por muito tempo. Heloísa pediu-me que não a abandonasse, que continuasse gostando dela e que a esperasse. Apesar de amar aquela menina, neguei correspondê-la à distância. O que eu sentia não podia esperar. Precisava viver tudo aquilo que os amantes das novelas viviam. Não poderia esperar o que, de repente, não existisse dois dias depois. Contudo, Heloísa parecia não compreender minha posição e acusava-me de egoísta e de não ser amigo de verdade. De fato, era egoísta sim. Não conseguiria estar ao seu lado sem poder tocá-la, respirá-la, admirá-la. Lembro-me bem que senti-me o homem mais tolo, bobo e enganado. O que eu gostaria, na verdade, era de estar acima de tudo que estava acontecendo, sem sofrimentos. Entretanto, não conseguia mais imaginar meu futuro sem a menina ruiva que mexia comigo, o que fazia-me sentir cada vez mais o quando estava saindo fragilizado daquela relação.

OU NÃO?

Um outro lado da situação é a ausência de figuras com as quais já estávamos acostumados; o velho vai embora para dar lugar ao novo. Será que tem que ser assim?

SÃO SÓ PALAVRAS!


Se são só palavras, quero assistir suas falcatruas para desmentir tudo isso. Quero escancarar de vez essa relação tortuosa e pecaminosa. Que seu corpo imundo seja queimado. É, queimado! Você queria ouvir coisa amorosas? Queria? Então vá para o raio que a parta!

Parei, como se estivesse incorporado, e percebi as pessoas no ponto de ônibus escutando a conversa. Aquele papo não deveria interessar ninguém. Era meu e de minha amada! Somente nosso. O mais interessante era que, em meio aquela multidão de desconhecidos, sentia existir somente duas pessoas de verdade. O restante eram rostos sem forma alguma, ávidos para que acontecesse uma briga séria.
Que loucura! Estamos discutindo nossa relação em plena Central do Brasil, disse.
Continue! Os camelôs e transeuntes não nos conhecem e esse forró altíssimo não permite que eles entendam muita coisa.
Sei! Mas vamos sair daqui. Esse ambiente não é propício para uma conversa a dois.
Você vai continuar ou não? Espero meses para que digas realmente o que sentes e pensas, e agora você cisma com a Central. Vê se pode?

TALITA

Ah! Talita, Talita, Talita... Eu quero mais é que suas palavras dissimuladas se explodam no universo do seu mundinho!

MUITAS COISAS

- Sabe, não tenho tempo a perder. Preciso viver muitas coisas ainda. Preciso comprar minha casa. Preciso decorar minha casa. Preciso fazer uma plantação no meu quintal. Preciso criar galinhas. Preciso enxergar o crescimento da mangueira no quintal. Preciso fazer amor com amor. Preciso ensinar meu filho jogar bola. Preciso ganhar mais dinheiro. Preciso andar de carro zero. Preciso tomar café na varanda da casa lendo jornal num domingo de manhã. Preciso ouvir que sou o cara dos lábios de uma mulher. Preciso lançar um livro. Preciso ser entrevistado pelo Jô. Preciso comer aipim frito com manteiga de garrafa todos os fins de semana. Eu preciso dar um beijo de quatro horas. Eu preciso pintar minha casa. Eu preciso ouvir da minha mulher que não sei consertar nada. Eu preciso dançar juntinho “Bem que se quis” depois de fazer as pazes. Eu preciso comer todos os pratos da comida mineira. Eu preciso usar as mesmas roupas que meu filho. Eu preciso ver o Vasco penta campeão brasileiro. Eu preciso dormir e saber que no outro dia vou ter muito trabalho no serviço. Eu preciso não ser traído na primeira, segunda, centésima, milésima oportunidade. Eu preciso ver o sol amanhecer com uma mulher legal. Eu preciso receber visitas. Eu preciso visitar amigos. Eu preciso precisar sempre. Eu preciso ouvir a batida do coração... Eu preciso dar flores. Eu preciso dormir.

A FUGA

- E você quer que eu faça o quê, meu amor?
- Fuja comigo. Eu, você e as crianças que faremos.
- Pirou? Não temos nada. Vamos viver de quê?
- Não importa! Tenho duas passagens para Brasília.

SOMOS

Às vezes, tenho a nítida impressão que muitas coisas que vivemos são mecânicas. Sinto que nascemos, crescemos, trabalhamos, reproduzimos e morremos, como se fosse realmente isso nossa missão. Esquecemos que amamos, odiamos, detestamos, nos apaixonamos, sentimos saudades, esquecemos da outra pessoa como se esquece do almoço do dia passado, conseguimos amigos fiéis, infiéis, traímos, somos traídos, comemos jamelão, nos angustiamos, nos alegramos, beijamos, somos beijados, nos beijamos, declaramos amor, nos declamam poesias, recebemos bilhetes amorosos, damos flores, somos safados, queremos ser santos, nos convertemos, esquecemos nossos passados absurdos, torcemos por algum time, detestamos algum time (de preferência rubro-negro), ouvimos rádio, dançamos ao som das músicas mais bobas, declaramos guerra ao Latino, assistimos filmes americanos, desejamos filmes nacionais, bebemos vinho em adegas, comemos bacalhau, detestamos o Eurico Miranda, sabemos que Garrincha é rei, somos lindos, nos achamos feios, lavamos roupas, deixamos roupas jogadas no banheiro, gostamos de samba, dizemos que somos eruditos, somos História, vivemos pré-história, somos brasileiros, queremos ser estrangeiros, não desistimos nunca, na primeira oportunidade desistimos, amamos as praias do Nordeste, freqüentamos Ipanema e Arpoador, dormimos cedo demais, assistimos Jô todas as noites, recebemos e-mail´s, encaminhamos e-mail´s, dormimos com ventiladores barulhentos ligados, reclamamos dos mosquitos, vamos dormir com roupas furadas, queremos ser chiques até mesmo dormindo, escola de samba é verde e branco de Ramos, escola de samba é azul e branco de Madureira. Participamos de muitas coisas que traspassam a coerência do nascer, crescer, trabalhar, reproduzir e morrer.

- O que precisamos é aprender a nos adequar às mudanças, aceitar a nova realidade e tentar fazer com que cada momento seja especial. O que sentimos um pelo outro hoje, é especial. Amanhã ainda será? Só nos resta desejar que sim. Se é verdade que colhemos o que plantamos, vamos trabalhar duro no plantio das sementes e esperar que a natureza faça sua parte.
- Você está dando-me um fora?
- A minha resposta no momento é uma pergunta: “Será que vale a pena?” Estar longe de casa. Abrir mão do colo da mãe. Dispensar os paparicos do pai. Adiar as trocas de confidências com a irmã. Viver fazendo contas e chegar à conclusão de que – mais uma vez – o dinheiro não vai dar... E a lista poderia ser muito maior! Mas a pergunta que não pode calar é : será que vale a pena?
- ...

...

- Não quero ser injusta e coloco no outro prato da balança as vantagens ou compensações, mas parece perseguição! A balança não funciona!
- A melancolia que existe no esperar, no apegar, reflete o fosco de muitas cores que gostariam de ser vivas. A imagem projetada na miragem dos sonhos inacabáveis demonstram com exatidão indecifrável do quanto não se deve dedicar-se a quem não se dedica por você.
- Eu dedico-me muito à você, sim, seu ingrato. Você sabe disso! Mas para você tudo é muito simples. Sou mulher! Não posso decidir nada assim. Um homem pode sair e voltar de casa quando quiser. Me compreenda, estou confusa. Minha cabeça está cheia de interrogações, exclamações e muitas, muitas reticências...

COMEÇO, MEIO E FIM?

Dizem que todo romance tem começo e fim. Se não quero acreditar na frieza de uma teoria de quem talvez nunca amou, não sei ao certo. Contudo, os números não mentem. Os números, sempre eles. Os números dizem o que não quero saber. Talvez por querer acreditar em algo mais subjetivo, mais interpretativo. Os números não permitem interpretações, viagens e miragens.
O números dizem, nos entrenúmeros: começo, meio e fim. E se é você, ou não, que vai caminhar comigo, não sei não. Quero um coração inquieto e corajoso. Capaz de determinar a linha do horizonte a partir do leito companheiro e amigo. Quero a imprecisão dos atos amorosos, porém, prazerosos e duradouros. Quero o romantismo moderno, suave e eterno. Quero ter uma mulher com o perfume de uma rosa preservando a defesa inexata de seus espinhos. Mas percebo nosso romance em seu último estágio: fim.

POETA

A genialidade de um poeta não está puramente na sua capacidade de escrever aquilo que as pessoas gostam de ler. Sua genialidade vai muito além disso! Está muito mais na sua incapacidade "de ser", nesse Mundo, e mais ainda na enorme probabilidade de ser infeliz...

REALIDADE

A única realidade absoluta é a que (re)inventamos em nossa mente (insana, muitas vezes) a partir de momentos que gostaríamos que fossem possíveis. Costumamos enxergar as coisas que queremos... Ahhhhhhhh! Bendita seja a realidade absoluta. Sem ela não seríamos tão felizes!

Realidade

A única realidade absoluta é a que (re)inventamos em nossa mente (insana, muitas vezes) a partir de momentos que gostaríamos que fossem possíveis. Costumamos enxergar as coisas que queremos... Ahhhhhhhh! Bendita seja a realidade absoluta. Sem ela não seríamos tão felizes!

Realidade

A única realidade absoluta é a que (re)inventamos em nossa mente (insana, muitas vezes) a partir de momentos que gostaríamos que fossem possíveis. Costumamos enxergar as coisas que queremos... Ahhhhhhhh! Bendita seja a realidade absoluta. Sem ela não seríamos tão felizes!

PESQUISA PARA 2010

Pesquisa revela que Cristovam é o terceiro em intenção de voto para presidente da República em 2010.
Menos de dois anos das eleições presidenciais de outubro de 2010, o prestigiado jornalista Ricardo Noblat realizou enquete para conhecer a intenção de voto dos eleitores que frequentam o seu blog, um dos mais acessados do Brasil.

Após uma semana, pouco mais de 3. 381 mil internautas responderam à seguinte pergunta:
"Se a eleição para presidente da República fosse hoje em qual destes candidatos você votaria:"

1 - José Serra (PSDB) - 48.57%
2 - Dilma Rousseff (PT) - 24.61%
3 - Cristovam Buarque (PDT) - 8.78%
4 - Heloísa Helena (PSOL) - 4.70%
5 - Ciro Gomes (PSB) - 4.23%
Em nenhum - 8.28

DOAÇÃO PARA OS RICOS

O que um estrangeiro entenderia o Brasil, ao saber que esse país DOA 10 bilhões de dólares ao FMI, e possui em seu próprio território hospitais caindo aos pedaços, Forças Armadas sucateadas, educação precária e professores mal-remunerados?
Como entender um partido que sempre criticou o FMI, e hoje DOA grana para os que sustentam a exploração humana em todo Mundo? Não podemos nos iludir que foi uma doação. Essa grana jamais voltará ao Brasil. Se voltar, será décadas depois! Nessa grande espera, quantos morrerão esperando atendimento na porta dos hospitais? Quantos professores ganharão miséria por mês, durante todo esse tempo? Quantos pequenos produtores rurais perderão suas produções por falta de socorro? Agora, o socorro daqueles que sempre nos exploraram vem de maneira sensacionalista, visando aumento de auto-estima de um povo massacrado... QUE CHIQUE!

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Se os Tubarões Fossem Homens

Se os tubarões fossem homens, eles fariam construir resistentes caixas do mar, para os peixes pequenos com todos os tipos de alimentos dentro, tanto vegetais, quanto animais.Eles cuidariam para que as caixas tivessem água sempre renovada e adotariam todas as providências sanitárias, cabíveis se por exemplo um peixinho ferisse a barbatana, imediatamente ele faria uma atadura a fim que não morressem antes do tempo. Para que os peixinhos não ficassem tristonhos, eles dariam cá e lá uma festa aquática, pois os peixes alegres tem gosto melhor que os tristonhos. Naturalmente também haveria escolas nas grandes caixas, nessas aulas os peixinhos aprenderiam como nadar para a guela dos tubarões.Eles aprenderiam, por exemplo a usar a geografia, a fim de encontrar os grandes tubarões, deitados preguiçosamente por aí. aula principal seria naturalmente a formação moral dos peixinhos.Eles seriam ensinados de que o ato mais grandioso e mais belo é o sacrifício alegre de um peixinho, e que todos eles deveriam acreditar nos tubarões, sobretudo quando esses dizem que velam pelo belo futuro dos peixinhos. Se encucaria nos peixinhos que esse futuro só estaria garantido se aprendessem a obediência.Antes de tudo os peixinhos deveriam guardar-se antes de qualquer inclinação baixa, materialista, egoísta e marxista e denunciaria imediatamente aos tubarões se qualquer deles manifestasse essas inclinações. Se os tubarões fossem homens, eles naturalmente fariam guerra entre sí a fim de conquistar caixas de peixes e peixinhos estrangeiros. As guerras seriam conduzidas pelos seus próprios peixinhos. Eles ensinariam os peixinhos que entre eles os peixinhos de outros tubarões existem gigantescas diferenças, eles anunciariam que os peixinhos são reconhecidamente mudos e calam nas mais diferentes línguas, sendo assim impossível que entendam um ao outro. Cada peixinho que na guerra matasse alguns peixinhos inimigos Da outra língua silenciosos, seria condecorado com uma pequena ordem das algas e receberia o título de herói.Se os tubarões fossem homens, haveria entre eles naturalmente também uma arte, havia belos quadros, nos quais os dentes dos tubarões seriam pintados em vistosas cores e suas guelas seriam representadas como inocentes parques de recreio, nos quais se poderia brincar magnificamente. Os teatros do fundo do mar mostrariam como os valorosos peixinhos nadam entusiasmados para as guelas dos tubarões. A música seria tão bela, tão bela que os peixinhos sob seus acordes, a orquestra na frente entrariam em massa para as guelas dos tubarões sonhadores e possuídos pelos mais agradáveis pensamentos .Também haveria uma religião ali.Se os tubarões fossem homens, ela ensinaria essa religião e só na barriga dos tubarões é que começaria verdadeiramente a vida.Ademais, se os tubarões fossem homens, também acabaria a igualdade que hoje existe entre os peixinhos, alguns deles obteriam cargos e seriam postos acima dos outros.Os que fossem um pouquinho maiores poderiam inclusive comer os menores, isso só seria agradável aos tubarões pois eles mesmos obteriam assim mais constantemente maiores bocados para devorar e os peixinhos maiores que deteriam os cargos valeriam pela ordem entre os peixinhos para que estes chegassem a ser, professores, oficiais, engenheiro da construção de caixas e assim por diante. Curto e grosso, só então haveria civilização no mar, se os tubarões fossem homens.

Sobre o(a) autor(a):
Bertold Brecht (1898-1956), nascido em Augsburgo. Escritor e dramaturgo alemão, além de grande teórico teatral. Desde menino escrevia poesias de forte conteúdo social. Foi perseguido pelos nazistas pelo seu comunismo militante.

Paradoxos

Dou-me de presente todas as idéias. Só não me dou de presente a idéia de infinito. Não me acostumei em vida a justificar qualquer hierarquia, não me acostumei a pensar a desigualdade. A relação do homem com o infinito não passa pelo campo do saber. O infinito é um desejo que se nutre de sua própria fome de... infinito!Eu, um metafísico?! De jeito nenhum. Encantam-me os paradoxos. Ou melhor: sou vítima dos paradoxos. Se levanto o punhal para assassiná-los, os paradoxos zombam de mim. Quanto mais zombam de mim, mais os admiro, por sua inconsistência sedutora. Ah! Os paradoxos!... Tento corrigi-los. Ossos do ofício de quem foi um dia revisor de jornal!

Sobre o(a) autor(a):
Nasceu em Quebrângulo, AL (1892-1953). Chegou a ser prefeito da pequena cidade de Palmeira dos Índios, AL. Sempre preocupado com problemas do ensino no Brasil. Preso em 1936 sob suspeita de ligação ao PCB. Principal romancista da 2ª fase do Modernismo.

2008: 120 ANOS DO NASCIMENTO DE FERNANDO PESSOA.A alma humana é um manicômio de caricaturas.Se uma alma pudesse revelar-se com verdadeE nem houvesse um pudor mais profundo que todas as vergonhas conhecidas, definidasSeria, como dizem, da verdade o poço.Mas um poço sinistro, cheio de ecos vagos, habitado por vidas ignóbeis, viscosidades sem vida, lesmas sem ser. Ranho da subjetividade. Eis a alma.

Sobre o(a) autor(a):
Fernando Pessoa (1888 - 1935) nasceu em Lisboa/Portugal.É considerado um dos mais importantes poetas modernistas.Criou heterônimos famosos como Alberto Caieiro, Ricardo Reis e Álvaro Campos.

O escritor vive. Ninguém é escritor das oito ao meio-dia e das duas às seis. Quem é poeta é poeta sempre, e se vê continuamente assaltado pela poesia. Assim como o pintor é assediado pelas cores e pelas formas, assim como o músico se sente procurado pelo estranho mundo dos sons (o mundo mais estranho das artes), o escritor deve pensar que tudo é argila, com que fará da miserável circunstância de nossa vida alguma coisa que possa aspirar à eternidade.Sobre o(a) autor(a):Jorge Luis Borges é argentino, mas sua literatura teve forte influência dos autores ingleses. Nas poesias e ensaios, a biblioteca de seu pai é uma referência constante.

Sobre o(a) autor(a):
Jorge Luis Borges é argentino, mas sua literatura teve forte influência dos autores ingleses. Nas poesias e ensaios, a biblioteca de seu pai é uma referência constante.